As primeiras produções cinematográficas na Madeira, à semelhança de toda a Europa, foram registos documentais (7),  produzidos por portugueses e estrangeiros.

  John Benett-Stanford

O primeiro registo cinematográfio na Madeira, da autoria de John Benett-Stanford, data de março de 1899. O Diário de Notícias (14/05/1897, p 2) divulgou o sucedido, com o título “Animatographo”:

“Na sexta-feira ultima, o sr. Benett Stanford, querendo tirar varias vistas para o seu animatographo, alugou o elevador do Monte, […], tendo, durante o percurso, reproduzido algumas das bellas paizagens que d’ali se disfructám. Chegados ao Monte, […] o sr. Benett Stanford, […] dispôz as cousas por forma que um dos carrinhos de vimes, ao descer o caminho velho do Monte, fosse esbarrar num burro […] a fim de o fazer cahir sobre dois individuos que tomariam logar no referido carro. Ao mesmo tempo que se désse este facto, deviam ser despejados dois saccos cheios de farelos naquelle local, para produzir maior effeito. As cousas passaram-se, como estavam  combinadas, havendo só a lamentar a escoriação causada no burro […])”.

               John Benett  Stanford                              (1870-1947)

Podemos dizer que estávamos, já, perante algo bastante elaborado para a época e com os meios disponíveis. Mas sabemos que John Benett-Stanford (1870-1947), também chamado “Mad Jack”, era um curioso do cinema . Este proprietário de terras e fotógrafo inglês esteve em serviço no Sudão (1898), como correspondente de guerra para o Western Morning News. Adquiriu uma câmara de filmar antes de partir, em Inglaterra, da Prestwich Manufacturing Company.

Em 1899, fez um par de vistas na Madeira, onde a família tinha uma casa, além de uma variedade de cenas de quinta.

Nos anos seguintes, realizaram-se apenas registos documentais, normalmente relacionados com a Madeira enquanto atração turística. Aqui destaca-se: Madeira, realizado por estrangeiros e distribuído por uma empresa francesa e pelo inglês George Klein, em 1911. Trata-se de uma fita de 35 mm, com a duração de 90 segundos, onde se veem imagens típicas da Ilha.

Joao Reis Gomes 

O primeiro filme de ficção madeirense conhecido foi o de João dos Reis Gomes,  O Cerco de Safim. No filme, representava-se uma cena da peça de teatro Guiomar Teixeira, que foi exibida durante a representação. Esta peça teve por base a novela histórica A Filha de Tristão das Damas, da autoria do próprio João dos Reis Gomes.

 João Reis Gomes (1869-1950)

As filmagens tiveram lugar no dia 25 de maio de 1913, como anunciou o Diário de Notícias: “Amanhã, pelas 6 horas da manhã, um grupo de cerca de 60 cavalleiros dirigir-se-ha para o sitio da Cancella, freguezia do Caniço, com o fim de ser tirada ali uma fita cinematographica de grande effeito” (Diário de Notícias, 24/5/1913, p. 1 ).

O filme, com a duração aproximada de dez minutos e onde se recriava uma batalha entre cristãos e muçulmanos, foi exibido durante a representação no Teatro Funchalense a 28 de junho de 1913. As imagens, da responsabilidade de André Valldaura, foram comentadas pelos próprios atores que, acompanhados por uma orquestra, se consideravam dentro da fortaleza de Safim.

A estreia foi um sucesso, uma vez que se tratou de “ (…) uma verdadeira noite d’ arte, quer sob o ponto de vista litterario, quer pelo desempenho a cargo de senhoras e cavalheiros da nossa mais distincta sociedade”. O espetáculo iniciou-se às vinte horas, com a sala completamente esgotada, sendo a assistência verdadeiramente selecionada.

Terá sido uma das primeira ocasiões em que se fundiu a ação do cinema com a do teatro, em Portugal.

O Cerco de Safim, João Reis Gomes, 1913.

(7) O documentário é um registo mas com técnica cinematográfica (montagem, enquadramento, etc.) e uso da linguagem do narrador. A estas primeiras produções cinematográficas ,vamos chamar  vistas ou quadros.

(8) Diário de Notícias, ano XXXVII, Nº 11602, domingo, 25 de maio de 1913, p. 2.