O Funchal no início do século XX

O Funchal, cidade pequena e pobre, crescia, no final do século XIX, de forma desordenada e ocasional, sem condições de base e com graves problemas de salubridade. As galinhas andavam livremente nas margens das ribeiras (1) e no cais, porta de entrada na urbe, persistia “uma praia inestética, onde se cultivavam abóboras, pimpinelas e hortaliças, parecendo um lugar rústico e nunca arredores do cais da cidade.” (2)

A Madeira era uma região de contrastes: o analfabetismo, a ruralidade e a pobreza coexistiam com o cosmopolitismo, as publicações estrangeiras e as últimas invenções. Talvez por isso, os madeirenses tivessem tido, desde muito cedo, contacto com o cinema, que depressa começou a fazer parte do quotidiano dos habitantes da cidade, ricos e pobres, cultos e analfabetos. Os primeiros anos de exibição foram de alguma euforia, sendo ilustrativo disso o número de salas de espetáculos inauguradas na época.

Tal como a exibição, a produção cinematográfica também se manifestou muito cedo na Madeira. Os primeiros filmes realizados na Ilha, à semelhança do resto da Europa, foram registos documentais da Ilha e da sua gente, normalmente realizados por estrangeiros, em férias ou de passagem breve. Nestas películas, a Madeira é vista como uma Ilha paradisíaca, destacando-se, por exemplo, a beleza da paisagem e o clima ameno ou, contrariamente, com um olhar crítico, referindo-se a pobreza, ao isolamento e ao subdesenvolvimento, embora existam documentários, média-metragens de enredo e ficção de autoria de madeirense.

A primeira exibição cinematográfica pública paga foi promovida pelos Irmãos Lumière, em Paris, a 28 de dezembro de 1895. Uns meses mais tarde, em Portugal, no dia 18 de junho de 1896, no Real Coliseu, na Rua da Palma.

No Funchal, o animatógrafo (ou cinematógrafo) foi exibido, pela primeira vez, a 15 de maio de 1897, no Teatro D. Maria Pia (atual Teatro Baltazar Dias). O espetáculo promovido pelos irmãos Rodrigues – Henrique Augusto (1856-1934) e João Anacleto (1869-1948) – decorreu e foi, segundo a imprensa, do agrado geral. O programa das primeiras sessões era composto por doze curtas-metragens, registos documentais à moda dos irmãos Lumière, complementadas pela música de uma orquestra.

Cartaz de promoção do cinematógrafo dos Irmãos Lumière

 Fachada do Animatógrafo do Rossio, inaugurado em 1907.

Exemplar de um Cinematógrafo dos Irmãos Lumière.

(1) LOPES, Agostinho do Amaral, A Obra de Fernão Ornelas na Presidência da Câmara Municipal do Funchal 1935-1946, Funchal, dezembro de 2005. Tese de Mestrado, p. 38.

(2) CALDEIRA, Abel Marques, O Funchal no Primeiro Quartel do Século XX, 2ª Edição, Funchal, Editorial Eco do Funchal, 1995, p. 13.