Em nota à crónica de Jerónimo Dias Leite, o capitão Diogo de Bettencourt Perestrelo (1618-1680), é dito  “homem  muito  discreto,  e  muito  lido,  e  muito  bemfeitor,  e  primoroso”. Cavaleiro professo da Ordem de Cristo e provedor da Santa Casa da Misericórdia, foi sepultado na igreja matriz do Porto Santo. (1)

Testamento do capitão Diogo de Bettencourt Perestrelo, “Pai fundador” dos morgados Bettencourt Perestrelo, ABM, FBPV, liv. 5, f. 2 v.º-3; 15 v.º

O testamento de Diogo de Bettencourt Perestrelo, em 1680, é o documento fundador dos morgados Bettencourt Perestrelo. Nele, deixa a terça dos seus bens a sua mulher D. Luísa Agostinha, e por morte desta aos filhos D. Bernardina e Paulo Freire de Noronha: para cada um, metade da terça, vinculada a um encargo anual de 5 missas e com poder de nomear para lhes suceder na administração da dita terça o filho mais obediente.

1. Paulo Freire de Noronha, sargento-mor do Porto Santo (ƚ 1712)

Conchavo do dote ao senhor Paulo Freire e Cartas sobre ele, 1689, ABM, FBPV, cx. 1, n.º 2.

D. Bernardina morreu solteira e seu irmão Paulo Freire de Noronha herdou toda a terça de seu pai, sendo o primeiro de sete morgados que a administraram.

Em 05-06-1689, Paulo casou a gosto das respetivas famílias com D. Ângela de Sousa e Aragão. Pelo acordo de dote, D. Maria da Estrela, tia da noiva, abonou o casamento. A mãe do noivo doou-lhe as terras vinculadas do Engenho e dos Galegos no Estreito da Calheta: em duas cartas, conservadas com a escritura e os autos de posse, D. Luísa Agostinha de Noronha congratulou o seu filho e o irmão da noiva doutor Cristóvão de Lira e Sousa, mestre-escola da Sé e Comissário do Santo Ofício.

2. Morgado António Bettencourt Perestrelo e Lira, escrivão da ribeira e despachos na Alfândega do Funchal (ƚ 1767)

Filho primogénito, foi nomeado por seu pai para lhe suceder. Não obstante, em 1718, disputou com seu irmão José pela posse de certas fazendas. Nesse ano casou com Maria Cecília de Moura e Vasconcelos, neta do capitão Brás Mendes de Sousa, familiar do Santo Ofício. Em testamento de 28-09-1764, nomeou como herdeira da terça sua filha D. Luísa Agostinha Bettencourt, cuja obediência e amor filial afirmou. Este morgado poderá ser o autor do Nobiliário de Bettencourt Perestrelo. Seu filho António ingressou sob o nome de “Frei Paulo” na Trappa (França), onde morreu com fama de santo.

Embargos (do)  capitão  Antonio  de  Bettencourt  Perestrello  às  posses  que  tomou  seu irmão José de Vasconcelos Bettencourt, ABM, FBPV, liv. 4, f. 170 v.º.

3. D. Luísa Agostinha Bettencourt

D. Luísa Agostinha herdou a terça dos Bettencourt Perestrelo, embora tivesse fugido para não assinar a escritura de casamento com seu primo Mateus Cabral de Barros e Câmara. A 12-11-1744, na ermida de N. S. do Desterro, casou “a furto” com Pedro Paulino de Vasconcelos, que passou a administrar a terça como “cabeça” da morgada sua mulher.

Diogo de Bettencourt Perestrelo em vão alegou ser o filho mais obediente, logo mais digno de herdar a terça: os desembargadores da Relação validaram o testamento do instituidor do vínculo e o do pai da morgada escolhida.

“Sentenças que alcançou Pedro Paulino de Vasconcellos Como cabeça de sua mulher Dona Luisa Agostinha de Noronha Bettencourt sobre a 3ª que instituiu Diogo Bettencourt Perestrelo Governador e Capitão Donatário da Ilha do Porto Santo”, ABM, FBPV, liv. 4., f. 106.

4. Morgado António Bettencourt Perestrelo e Vasconcelos

Foi o primeiro a agregar o patronímico Vasconcelos, herdado de Pedro Paulino, aos apelidos Bettencourt Perestrelo.

Em 24-10-1791, casou na capela de Nossa Senhora da Estrela (Calheta) com Clara Delfina, filha do capitão Manuel Rodrigues Teixeira e de Antónia Filipa Bettencourt e Atouguia:  foram testemunhas o capitão Paulo Freire de Bettencourt Perestrelo de Noronha Homem de Gouveia e o cura da colegiada da Calheta, Francisco de Atouguia Bettencourt. Prestou contas da capela de Diogo Bettencourt Perestrelo em 05-07-1817.

Registo do casamento de António Bettencourt Perestrelo e Clara Delfina, ABM, Paróquia da Calheta, liv. 536, f. 55 v.º.

5. Morgado Francisco Bettencourt Perestrelo e Vasconcelos e Francisca Agostinha de França Doria

Em 26-08-1823, este morgado obteve sentença reconhecendo a sua antiga posse (mais de 130 anos) de águas do morgadio. Em 1831 prestou contas das capelas de Diogo  de Bettencourt Perestrelo,  Manuel de  Florença  e  D. Maria da Estrela.

A sua correspondência atesta a sua envolvência em lutas políticas, bem como as suas relações afetuosas com parentes como D.  Inácia Antónia de Seixas Sotomaior, de quem foi herdeiro, ou ainda a prima D. Ana (D. Ana Angélica Bettencourt Perestrelo da Câmara, morgada dos Reis Magos).

Processo da capela de Diogo de Bettencourt Perestrelo, ABM, JRC, cx. 220, n.º 6, f. 61 v.º.
Petição de Francisco Bettencourt Perestrelo, major das ordenações do distrito da Calheta, preso na fortaleza do Ilhéu, para ser transferido para outra prisão da cidade, ABM, FBPV, cx. 1, n.º 114.
Carta para Francisco Bettencourt Perestrelo de sua tia D. Inácia Sotomaior, 1821-07-12, ABM, FBPV, cx. 1, n.º 126.
Carta de D. Ana Perestrelo a seu primo Francisco Bettencourt Perestrelo e Vasconcelos, s.d., ABM, FBPV, cx. 1, n.º 110.

6. Morgado António Bettencourt Perestrelo e Vasconcelos 1859) e Rosa Augusta Bettencourt de França

De abril de 1838 a 1840 permaneceu em Canárias, onde se agravou o tumor na cabeça de que sofria: chegou a fazer testamento. A sua correspondência ilustra o modus vivendi da fidalguia rural madeirense; uma das cartas mais curiosas foi-lhe dirigida por seu capelão e confidente D. Angel Perdomo, em vésperas do seu casamento. Como muitos morgados, sofreu sérios apertos financeiros. (2)

Carta dirigida a António Bettencourt Perestrelo por seu capelão Angel Perdomo de Bettencourt, dando conselhos para bem viver o matrimónio. 1843, ABM, FBPV, cx. 2, n.º 46.

7. Morgado José António Bettencourt Perestrelo (1845-1916) e D. Gerarda Paulina Marcial (1847-1925)

José António Bettencourt Perestrelo, último morgado, e D. Gerarda Paulina Marcial.

Foi o último morgado: é de 19-05-1863 a lei de abolição dos vínculos.

Adquiriu diversas propriedades no Estreito da Calheta, encontrando-se no arquivo as escrituras. (3)

Em 04-05-1871, como filho do anterior morgado, foi intimado a pagar as pensões dos vínculos e capelas de Diogo Bettencourt Perestrelo, D. Maria da Estrela e Manuel de Florença. Em 30-04-1872, obteve alvará de cumprimento dos encargos em causa. Em 1886 casou  na  Calheta  com  D.  Gerarda  Paulina  Marcial,  filha  de  Luís  Marcial e  de  Bebiana  Carolina  Marcial,  moradores  no  Lombo  da  Estrela.

8. José António Bettencourt Perestrelo de Vasconcelos Júnior (1887-1957) e D. Maria Cira Henriques Figueira de Macedo (1887-1979)

Os poucos documentos do arquivo de família referentes a este filho do último morgado registam as suas datas vitais. Nasceu no Estreito da Calheta, em 04-09-1887. Casou em 02-07-1908, em Santa Luzia, Funchal, com Maria Cira, nascida a 31-01-1887, filha de Evaristo António Abreu Macedo e de Maria Elisa Henriques Figueira de Macedo. Em 1911 morava na Encarnação, em Santa Luzia. Faleceu no Estreito da Calheta em 1957.

José António Bettencourt Perestrelo, filho do último morgado, e Maria Cira Henriques Figueira de Macedo.

Referências:

(1) LEITE, Jerónimo Dias, 1947, Descobrimento da Ilha da Madeira e discurso da vida e feitos dos capitães da dita ilha, p. 115.

(2) ABM, FBPV, cx. 2, n.º 199.

(3) ABM, FBPV, cx. 2, n.º 120, 130, 132 e 217.